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Congresso de Nutrição Funcional debateu Jornada da Felicidade para prevenir declínio cognitivo

Hermínia Brandão  
herminia@jornal3idade.com.br

Cada vez mais todas as pessoas, de todas as idades, escutam que podem envelhecer mais saudáveis através da atividade física, nutrição eficiente e suplementação necessária para complementar o aporte de nutrientes.

Especialmente quem já passou dos 60 anos sente que manter a saúde mental em equilíbrio, preservando as relações no seu convívio social, faz parte desse cardápio de boas práticas.

O que profissionais e estudiosos adeptos a uma alimentação funcional (aquela que propõe uma comida além do seu índice nutricional mas, com efeito, protetor no organismo) estão pregando é que a sustentabilidade dos seres humanos e do planeta estão interligadas. Está provado que o aumento da produção pecuária produz gases de efeito estufa na forma de metano (CH4) e óxido nitroso (N2O). Plantar e comer mais vegetais pode mudar isso.

Diante de tantas catástrofes climáticas que estamos presenciando, esse é um tema que as pessoas idosas têm que parar, pensar e colocar nas suas rodas de conversa.

Durante três dias (14 a 16 de setembro) o XVII Congresso Internacional de Nutrição Funcional, o maior mundial no assunto, criado no Brasil pela nutricionista e pesquisadora Valéria Paschoal, teve como tema A Jornada da Felicidade. O evento, realizado no Centro de Convenções Frei Caneca, apresentou além dos congressos científicos, produtos e serviços de empresas (leia) que na mesma linha de pensamento estão desenvolvendo alimentos e suplementos alimentares que podem reduzir o risco de doenças crônicas, otimizar a saúde e cuidar melhor do planeta.

O Congresso não foi voltado para as questões do envelhecimento (como a edição de 2019 que teve como tema Alimentação para uma boa longevidade), mas apresentou nutricionistas e empresas preocupadas em oferecer opções para os mais velhos.

Para entender mais sobre essa proposta de “jornada da felicidade”, o Jornal da 3ª Idade conversou com a Dra. Paula Gandin, que coordenou todo o Bloco Longevidade do congresso, que reuniu palestras de vários profissionais com foco na alimentação das pessoas idosas ou debilitadas.

Nutricionista e psicóloga que atua há 14 anos no atendimento clínico de pacientes com ênfase em mudanças no estilo de vida e comportamento alimentar, Paula Gandin se dedica extensamente em estudar os benefícios da nutrição baseada em plantas, ministrando aulas em todo Brasil. Palestrante pela IVU (International Vegetarian Union) em diversos países, ela atuou por anos como presidente do Instituto Brasileiro de Nutrição Funcional (IBNF) e como Conselheira da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB).Também é docente dos cursos de pós-graduação da VP – Centro de Nutrição Funcional, empresa organizadora do congresso.

Jornal da 3ª Idade –  O  XVII Congresso Internacional de Nutrição Funcional trouxe como inovação o 1º Congresso de Nutrição Plant- based que a senhora coordenou. Nele se falou muito de ancestralidade, da importância de se conhecer a genética para entender o porquê de adquirir doenças, mesmo aquelas que aparecem quando as pessoas já são idosas. Como a senhora define essa iniciativa?

Drª Paula Gandin No Congresso fizemos uma interligação entre estilo de vida e nutrição baseada em vegetais. Conseguimos realizar o 1º Congresso de Nutrição Plant- based dentro do congresso da VP e nele discutimos em várias palestras o quanto o estilo de vida influencia o declínio cognitivo, que é a maior preocupação entre as pessoas idosas.

Jornal da 3ª Idade – O que os profissionais da nutrição baseada em vegetais estão propondo para o acelerado processo de surgimento de demências na população? É possível uma prevenção maior com esse tipo de alimentação?

Drª Paula Gandin Várias das palestras do congresso abordaram os pilares para o declínio neurocognitivo, com ênfase nas pessoas que hoje tem uma função cognitiva normal, passam por um declínio subjetivo e depois podem progredir até chegar a desenvolver uma demência. Estamos no mês de setembro, que discute muito a questão do Alzheimer, então também é um momento de ampliarmos essa discussão. O que apresentamos foram fatores de estilo de vida de proteção?

Jornal da 3ª Idade – Estima-se que em 2050 teremos uma população mundial com demência de mais de 150 milhões de pessoas. Só no Brasil esses pacientes já passam dos 800 mil. A senhora acredita que a mudança no estilo de vida, principalmente associada à alimentação vegetariana, pode realmente ajudar a controlar essa expansão?

Drª Paula Gandin Principalmente os países de mais baixa renda são os que têm mais risco. Os fatores de risco de vida, modificáveis, são realmente aqueles que conseguimos fazer no dia a dia. Estamos falando de tabagismo, de sono irregular, de obesidade, uso de bebidas alcoólicas, de remédios em excesso. O declínio cognitivo mais avançado não tem cura, como várias das demências e a Doença de Alzheimer. Sabemos que o estilo de vida diminui a progressão dessas doenças. A progressão pode ser uma curva ascendente ou uma curva mais leve, que pode jogar a fase crítica para mais longe.

Jornal da 3ª Idade – Uma pessoa idosa, que foi criada comendo carne a vida toda, com uma alimentação baseada em produtos de origem animal, consegue fazer essa transição com tranquilidade?

Drª Paula GandinSabe aquela coisa do “Nunca é tarde”? Uma pessoa com 60 anos que começa a ter pequenos esquecimentos, mas tem autonomia e consegue fazer todas as funções, está no momento de mudar seu estilo de vida. Enquanto conseguimos fazer todas as coisas é quando mais precisamos da mudança do estilo de vida. Hoje temos pesquisas científicas que mostram que uma alimentação mais baseada em vegetais e menos em origem animal é protetiva em relação a essa questão cognitiva.

Jornal da 3ª Idade – Para a pessoa idosa que deseja começar a mudar hoje seu estilo de vida, o que a senhora recomenda?

Drª Paula GandinA atividade física, principalmente aeróbica, com intensidade moderada é extremamente importante. As pessoas que mantêm uma rede de apoio, com várias relações sociais são aquelas com menos declínio cognitivo. Existe um estudo muito interessante, feito nos EUA, com 5800 mulheres com mais de 60 anos, que não tinham nenhum tipo de apoio, nem participavam de nenhuma rede comunitária. O resultado do trabalho apontou que elas tinham duas vezes mais probabilidades de desenvolver demência.

Jornal da 3ª Idade Durante o processo de envelhecimento atual, quando as pessoas vão ficando mais sozinhas, a alimentação também vai se alterando. A tendência é buscar praticidade nas comidas prontas industrializadas. Se  é nesse momento que as pessoas idosas mais precisam de uma alimentação variada, que evite os desequilíbrios nutricionais, como fazer as coisas darem certo no dia a dia?

Drª Paula GandinMuitas pessoas pensam que ao falar na mudança do estilo de vida está se propondo começar uma academia ou fazer comidas difíceis. Nada disso. Atividade física é movimento, autonomia, descer e subir escada, fazer caminhada perto de casa, formar um grupo para caminhar com amigos. Mudança alimentar é a mesma coisa. Simples mudança no dia a dia, como reduzir o açúcar, comer mais vegetais, menos gordura saturada. Quando se fala de manejo de estresse, a meditação e as práticas estão aparecendo, no mundo todo, como uma forma direta de bem- estar.

Jornal da 3ª Idade – São Paulo, por exemplo, têm centenas de Núcleos de Convivência da Pessoa Idosa, com lanches subsidiados com dinheiro público. Neles são oferecidos bolos e pães industrializados e a alegação é que não existe ainda uma indústria mais naturalista com porte para uma grande quantidade de abastecimento. A senhora concorda?

Drª Paula GandinO principal é a mudança de paradigma. Por que comprar um alimento refinado, no pacotinho e não oferecer uma fruta? Por que continuar a oferecer produtos processados? Isso não é só uma mudança de conceito de saúde, mas de política social. Temos um grande trabalho pela frente para mudar essa realidade. Começa por oferecer aos profissionais de saúde, as ferramentas que eles dispõem para falar para o seu paciente que ao invés de tomar muitos remédios a vida inteira para diabetes e hipertensão é possível mudar grande parte do seu quadro com uma alimentação saudável. Essa foi a missão do nosso congresso. Temos vários casos de sucesso dentro do SUS, de lugares que mudaram esse tipo de oferta em lugares públicos e deu bastante resultado. É mudança de mentalidade e isso dá trabalho.